17.11.2025 · 5:58 · Vereadora Luiza Ribeiro
A Câmara Municipal de Campo Grande recebeu, na manhã desta segunda-feira (17), lideranças das religiões de matriz africana e ameríndias para uma audiência pública dedicada ao debate sobre direitos, políticas públicas e o combate ao racismo religioso. A iniciativa foi proposta pela vereadora Luiza Ribeiro (PT) e teve início com uma louvação aos orixás, conduzida pelos líderes religiosos presentes, um ato que reafirmou a importância simbólica e espiritual de ocupar a Casa de Leis com a ancestralidade do Povo do Axé. Embora a Câmara já tenha sediado debates semelhantes, a presença dos povos tradicionais segue sendo fundamental para a visibilidade e a defesa de seus direitos.
O encontro reuniu representações do Ministério Público Estadual, pesquisadores, movimentos sociais e diversas lideranças religiosas que trouxeram relatos preocupantes de intolerância e discriminação.
Presidente da Comissão Permanente de Políticas e Direitos das Mulheres, de Cidadania e de Direitos Humanos, Luiza defendeu a urgência da pauta.
“Quando há preconceito e exclusão, surge também a violência. Precisamos garantir que os povos de matriz africana e ameríndias tenham seus direitos assegurados e sejam reconhecidos pela contribuição que oferecem à nossa cidade. Essa audiência é um passo importante para ampliar o respeito e combater a intolerância religiosa”, destacou.
Foram relatados casos de ataques a terreiros, discriminação contra crianças em escolas públicas e até recusa de atendimento profissional por motivo religioso. Para Luiza, a Câmara precisa ser instrumento de enfrentamento:
“Essas situações precisam ser discutidas aqui. A Casa de Leis deve encaminhar soluções que assegurem o respeito ao Povo do Axé e a efetivação dos direitos garantidos pela Constituição.”
Entre as principais reivindicações apresentadas estiveram a criação de uma delegacia especializada para registrar e investigar crimes de intolerância religiosa; a criação do Conselho Municipal das Religiões de Matriz Africana; e a preservação de espaços sagrados.
O Bàbálórìṣà Augusto de Lógunẹ̀dẹ, presidente do Instituto Yalodê, reforçou a necessidade de instrumentos estatais de proteção:
“O povo de Axé enfrenta intolerância, descaso e perseguição. Uma audiência como essa é fundamental para garantir nossos direitos. É uma luta constante para existir e sobreviver até hoje.”
O presidente da Fecams, Bàbálórìṣà Gaeta de Òṣàlùfọ̀n, chamou atenção para o aumento expressivo das situações de violência religiosa neste ano:
“As pessoas precisam entender que intolerância religiosa é crime. Queremos políticas públicas que nos acolham e nos defendam, seja na educação, saúde, saneamento ou meio ambiente. Nosso comportamento e nosso modo de vida precisam ser respeitados.”
Já o Bàbálórìṣà Deá Odé, presidente da Federação das Religiões dos Povos de Terreiro do MS e da Federação Ajô Nilê, lembrou que, apesar da crescente visibilidade das religiões de matriz africana na cultura brasileira, o conhecimento ainda não chega a toda população:
“Nossa religião está em ascensão, muitos artistas a têm assumido, mas a informação não acompanha. Precisamos estar aqui para orientar nosso povo e cobrar direitos que muitas vezes são negados.”
A sacerdotisa da Umbanda Rayane Jarcem reforçou o papel da educação e da memória:
“Nossa história não é apenas sobre dor. A educação me permitiu ver nossa religião de outra forma. A memória é nosso maior patrimônio, e precisa ser preservada e contada.”
O promotor de Justiça Douglas Silva Teixeira, do Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial, ressaltou a importância de discutir políticas públicas específicas e reforçou que o MPE atua para garantir os direitos constitucionais das comunidades religiosas:
“Há uma herança histórica que precisa ser preservada. Ainda existe intolerância contra as religiões de matriz africana e isso não é admissível. As pessoas têm liberdade religiosa, e qualquer violação disso deve ser denunciada ao Ministério Público.”
Ele lembrou que o MPE está disponível para receber denúncias tanto na Capital quanto nas promotorias do interior.
A promotora de Justiça Paula Volpe destacou que as denúncias recebidas pelo órgão já resultaram em ações e condenações no Estado. Também informou que denúncias envolvendo a gestão municipal foram encaminhadas ao Procurador-Geral de Justiça:
“Encaminhamos todas as reclamações para apuração. O procedimento já está em fase de instrução, com coleta de provas, para que as denúncias tenham o devido andamento.”
O professor Antônio Lino Rodrigues de Sá, pesquisador da UFMS por 17 anos, classificou o debate como um momento relevante de fortalecimento das comunidades tradicionais:
“Esse espaço é necessário. Ele sinaliza caminhos para organização, apoio e construção de políticas concretas para os povos de matriz africana.”
O presidente do Conselho Municipal de Direitos do Negro, Felipe Araújo de Souza, criticou o abandono das pautas raciais pela gestão municipal atual:
“O movimento negro foi esquecido. Houve um verdadeiro desmonte das estruturas que tratavam do combate ao racismo.”
O representante provisório da Associação da Umbanda de Mato Grosso do Sul, José Luiz Mendes, apresentou novamente a demanda pelo tombamento e preservação da Praça do Preto Velho, espaço simbólico central para o Povo do Axé em Campo Grande. Mendes lamentou o abandono do local e destacou que há uma emenda parlamentar do deputado federal Vander Loubet (PT) destinada especificamente para melhorias na praça, recurso que ainda não foi aplicado pela Prefeitura.
“É triste ver o descaso com o único espaço que temos. Existe recurso assegurado, mas que não chega onde deveria. Precisamos que a praça seja preservada e valorizada.”
A audiência pública reforçou o compromisso da vereadora Luiza Ribeiro e da Câmara Municipal em defender a liberdade religiosa, combater a intolerância e construir políticas públicas que garantam dignidade, proteção e reconhecimento às comunidades de matriz africana e ameríndias.



